Gol de salto alto: o avanço do futebol feminino na mídia

  • 20/11/2022
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Gol de salto alto: o avanço do futebol feminino na mídia

Escrito por: Lucas Passoli.

“E o futebol feminino depende de vocês para sobreviver”. Foi assim que Marta se despediu da Copa do Mundo de Futebol Feminino de 2019. A primeira a ser transmitida em TV aberta no Brasil, pela TV Globo. Na ocasião, Marta se dirigia a todas as garotas que sonhavam em jogar futebol e nunca tiveram a chance ou o incentivo, mas o fato é que isso pode ser estendido a muito mais pessoas.

Emissoras de TV parecem ter ”descoberto” o esporte nos últimos 5 anos. Audiências históricas como a da Eurocopa feminina de 2022 mostraram a todos que o futebol feminino merece muito mais destaque e incentivo. A França, campeã mundial masculina de 2018, faturou cerca de U$38 milhões com a conquista. Já a seleção norte-americana, campeã mundial feminina de 2019, recebeu apenas U$4 milhões como premiação

O crescente número de transmissões é a prova de que a popularidade do esporte está diretamente ligada com a facilitação de seu consumo. Assim diz Gabriela Leveque, jogadora do sub-17 do Santos: “Com certeza tem ganhado mais popularidade o futebol feminino. Ainda estamos muito longe de alcançar a igualdade com o futebol masculino, mas já é um passo muito grande com as transmissões[...]”.

No Brasil a trajetória do futebol feminino só teve início em 1984, uma vez que as mulheres foram proibidas, por Getúlio Vargas, de jogar futebol. Radar, do Rio de Janeiro, e Saad, de São Paulo, foram os primeiros times profissionais de futebol feminino do Brasil, criado em 1984. Neste período da história o Brasil tinha uma de suas melhores seleções de todos os tempos na modalidade masculina, portanto além da questão cultural, era difícil para a recém nascida prática feminina ganhar a atenção de veículos televisivos.

Luciana Mariano. Foto: Reprodução

Luciana Mariano foi a primeira mulher a narrar uma partida de futebol feminino e disse que o principal desafio era encontrar informações sobre as jogadoras, uma vez que eram desvalorizadas. “eu e a repórter tivemos que bater nos vestiários das equipes para perguntar o nome e o número na camiseta das meninas[...]. Me lembro de anotar camisa 10, Sissi, sem saber o que aquela jogadora significava”. 

Sisleide Lima do Amor, conhecida como Sissi jogou na década de 90 e atuou em grandes clubes de São Paulo, como o próprio Tricolor Paulista. Além deste, passou também por Corinthians, Palmeiras e Saad. Sissi foi a artilheira da Copa do Mundo de Futebol Feminino em 1999. E pouco se sabia sobre essa mulher. 

A jogadora Sissi durante a disputa da medalha de bronza na Olimpíada de Sydney em 2000  Tony Marshall/EMPICS/Focus Features

A jogadora Sissi durante a disputa da medalha de bronza na Olimpíada de Sydney em 2000 Tony Marshall/EMPICS/Focus Features

Sissi foi inspiração de garotas na época, como Marta Vieira da Silva e Cristiane Rozeira de Souza Silva que anos depois se tornaram os rostos mais conhecidos da Seleção Brasileira

Para Luciana, o futebol feminino vive altos e baixos desde a década de 90, em que sofreu uma popularização e depois caiu no esquecimento. Porém Luciana diz que a internet é fator determinante para que o futebol feminino não sofra novos baques, e consiga manter o ritmo de ascensão e que seja realmente levado a sério.

A narradora também acredita que o momento em que a sociedade teve um estalo e começou a acompanhar o futebol feminino como realmente deve ser, ainda não chegou. Ela diz: “infelizmente o momento do gatilho da sociedade para darem atenção para o futebol feminino, ainda não aconteceu, não posso acreditar que este é o máximo que podemos atingir”.

As transmissões começaram a ter um foco maior no início desta década. A Libertadores feminina, por exemplo, nasceu em 2009 e conta com 16 equipes que disputam o torneio numa única sede. O Brasil tem uma hegemonia no torneio com 13 edições disputadas e 11 campeões sendo tupiniquins. Santos, São José, Corinthians, Ferroviária e o atual campeão, Palmeiras.

O Campeonato Brasileiro segue uma trajetória semelhante à Libertadores. Criada em 2013, com uma parceria entre CBF e Caixa Econômica, a competição contava com as 20 melhores equipes do Ranking nacional e possuía somente uma divisão. O primeiro título foi conquistado pela equipe paulista Centro Olímpico, que contava com as então promessas Cristiane, atualmente no Santos, Tamires, lateral direita do timão e a meia Gabi Zanotti do Corinthians.

Centro Olímpico, de São Paulo, foi o primeiro campeão do Campeonato Brasileiro Feminino, em 2013. Imagem: Divulgação/Centro Olímpico

Este formato prevaleceu até a criação de uma segunda divisão. Com a chegada da Série A2, o número de equipes na primeira divisão passou de 20 para 16. O mesmo número de equipes compõem a categoria inferior. Com o surgimento da Série A2 a CBF acabou com a Copa do Brasil feminina por falta de verba da entidade, que destina quantidades muito inferiores ao futebol feminino

O estado de São Paulo é hegemônico no cenário brasileiro: são 9 conquistas para o estado em 10 edições disputadas. O Corinthians é o maior vencedor e atual Campeão com 4 títulos. Ainda segundo Luciana, também a equipe com o melhor projeto de marketing e desenvolvimento da modalidade, este seria o motivo para o sucesso.

O sucesso à qual se refere Luciana levou à emissora de TV aberta, Bandeirantes, a adquirir os direitos de transmissão em 2019. A primeira grande chance das meninas provarem seu valor em uma das maiores emissoras do Brasil. O mesmo 2019 foi marcado pelo maior marco da televisão Brasileira para com o futebol feminino: a primeira transmissão completa de uma copa do mundo de futebol feminino. A copa do mundo foi sediada na França e conquistada pela seleção Americana.

Apesar da conquista, ela não foi a maior. Ao redor do mundo cerca de 1.12 bilhões de pessoas acompanharam ao menos 1 minuto do torneio. O número é 30% maior do que o anterior, ocorrida em 2015 no Canadá, que beirou os 760 milhões. Os meios digitais foram responsáveis por 43% desta audiência.

A Rede Globo de televisão realizou o ousado movimento de transmitir em TV aberta o maior evento esportivo da modalidade e isto foi parte da popularização do futebol. Gianni Infantino, presidente da FIFA, disse: “O fato de termos quebrado a meta de 1 bilhão mostra o poder de atração do futebol feminino e o fato de que, se promovermos e transmitirmos amplamente o futebol a nível mundial, seja ele jogado por homens ou mulheres, os fãs sempre vão querer assistir”.

Promoção e Transmissão foram os termos utilizados pelo chefe da entidade. Isso é o principal fator que pode levar o futebol feminino aos patamares desejados. No cenário nacional, o Brasileirão feminino é transmitido pela Globo, Sportv, ESPN e Bandeirantes na televisão, além do canal desimpedidos no YouTube.

O Sucesso do torneio serviu de combustível para a aquisição de outro campeonato para a Globo: A Eurocopa Feminina de Futebol, realizada em 2022. A competição teve como campeã a seleção inglesa e foi mais um marco para o futebol feminino, uma vez que foi integralmente transmitida pelo SporTV e com jogos de transmissão em rede aberta. A grande final bateu mais de 85.000 torcedores nas arquibancadas de Wembley acompanhando a partida de Inglaterra e Alemanha. 

Foto: Shaun Botterill/Getty Images

O grande público na final não foi o único recorde a ser quebrado. Na segunda rodada da fase de grupos, o número total de espectadores na arquibancada já era maior do que o da Eurocopa anterior inteira, 241 mil pessoas.

A Realidade do Futebol feminino no Brasil e no mundo é um cenário de franca ascensão, mas não pode ser visto como normal que em uma partida do Campeonato Paulista entre o Atual campeão da Libertadores, o Palmeiras, e o líder da competição, o São Paulo, receba um público de 187 pessoas. Porém assim foi o duelo acontecido em 19 de novembro de 2022. Com gol de Byanca Brasil e passe da Imperatriz, Bia Zaneratto, o alviverde venceu e assumiu a ponta da liderança do campeonato.

O fato curioso é que o duelo entre duas potências do País foi transmitido apenas pelo Streaming do YouTube da própria federação Paulista, sem nenhuma emissora tendo adquirido os direitos de transmissão do torneio. Cerca de 50.000 pessoas assistiram a partida ao vivo pela internet. Já na Arena Barueri, palco do Jogo, menos de 200 pessoas acompanharam.

Isto é a prova de que apesar dos grandes e satisfatórios avanços que a modalidade tem conquistado, não pode ser suficiente. A luta pela popularidade do esporte feminino não é algo apenas esportivo, é uma luta pela igualdade e pela representatividade. O jogo da vida de cada uma das meninas e mulheres que vivem neste universo é jogado também fora de campo, nas rádios,na internet, na televisão e nas arquibancadas porque como diz Luciana: “Este é o melhor momento que já vivemos na história do futebol feminino, Não podemos dar mais passos para trás”.


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Alessandra Barile Passoli

21/11/2022

Parabéns pelo conteúdo dessa matéria! Muito importante reconhecermos o avanço das nossas meninas no futebol e ver o desafio que ainda enfrentam!!

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